sábado, julho 05, 2008

A janela branca..


Olho através da janela. Aquela janela que todos temos. Imagino-a branca, com aquela tinta de verniz já antiga a sair em pequenas lascas, como se estivesse á espera de um carpinteiro desde que ali foi posta com intenção de servir todas pessoas que por ali passam, ou que já ali passaram.

Sei que terá algum tempo, imagino o que ela já terá observado. Imagino a olhar por dentro de guerras, quezílias de rua entre jovens de rostos sujos, com pingos de sangue a brotar de pequenas lascas de combate, dos resquícios que sobram, imagino que naquela altura a janela se terá mantido indiferente, dada a sua imparcialidade.

Ao espreitar por ele vejo o cego no fim da rua, a pedir esmola, num olhar rasgado e sincero de que não vê a realidade naquela encruzilhada de caminhos. Saberá o cego que não será triste não ver? Por vezes olhar significa falta de atenção, significa não estar a ver, não estar a observar, nao daria o cego a sua alma ao ter a oportunidade de rever a sua filha, de quem não conhece o rosto? De sentir as cores das flores, e os olhares das crianças? De poder ver só mais uma vez o azul do céu e o verde do mar? Sub-avaliámos o poder de um olhar, um olhar não é so um olhar, é um mundo que se abre à imaginação. Este cego aproveitaria a janela branca de pedaços lascados para aproveitar o castanho do Outono, o branco do Inverno, o verde da Primavera e o laranja do Verão. Aproveitar cada pedaço tempo para olhar durante um ano aquilo que os olhos lhe poderiam dar. Vamos aproveitar?

Enquanto isso, o cego põe outra vez os óculos escuros de quem afasta a miséria dos olhos brancos e rasgados de dor de quem um dia teve a oportunidade de ver e observar e não o aproveitou.

Os olhos do cego são a janela branca através dos quais quero observar o mundo, não olhar mas observar, como se fosse o último instante que conseguia ver e aproveitar todas as cores para relatar aquilo que vejo.

Os seus olhos brancos, são a minha janela branca.